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TJSP anula cláusula de estorno de compra e condena PagSeguro a ressarcir Ticketmaster

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    Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados
  • 22 de jul.
  • 5 min de leitura

Corte considera nula previsão que responsabiliza prestador de serviço por compra cancelada

Uma decisão da 22ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) anulou a chamada cláusula “chargeback”, que permite o estorno de compras indevidas em cartões de crédito. Com isso, obrigou a PagSeguro, da PagBank, a ressarcir a Ticketmaster em R$ 624 mil - cerca de R$ 950 mil em valores atualizados. O montante foi retido pela instituição financeira após a contestação de compras, obrigando a empresa de vendas de ingressos a arcar com o prejuízo.

 

A cláusula de chargeback serve principalmente para proteger o consumidor contra operações fraudulentas, mas também pode ser acionada quando há atraso na entrega da mercadoria ou o produto vier danificado. O titular do cartão contesta a compra com a administradora, que verifica se a transação é irregular. O consumidor recebe o estorno e a instituição repassa o custo para o lojista ou prestador de serviço - nesse caso, a Ticketmaster.

 

Nesse processo, porém, a Justiça entendeu que a responsabilidade é da intermediadora de pagamento - responsável por fazer a conexão entre a loja e o consumidor, por meio de “maquininha” ou plataforma on-line. Para o relator, o desembargador Roberto Mac Cracken, a previsão contratual é abusiva e nula “uma vez que resultaria na responsabilidade exclusiva do vendedor pelas ações decorrentes de seus compradores, no que tange à suspeita de fraude na utilização de cartão de crédito”.

 

A cláusula, afirma Mac Cracken, é “puramente potestativa”, isto é, depende apenas de uma das partes para que a negociação seja feita, o que é vedado pelo ordenamento jurídico, conforme artigo 122 do Código Civil. Avalia ainda que é uma situação de autotutela, pois há a “retenção de valores que deveriam ser repassados à parte adversa, sem o devido processo legal”.

 

Outras decisões já entenderam o chargeback como abusivo, mas não com esses fundamentos - caracterizando-a como “puramente potestativa”. Segundo advogados, o acórdão destoa da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o assunto. No entendimento mais recente, de fevereiro, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva estabeleceu que “é abusiva a cláusula que imputa ao lojista, em toda e qualquer circunstância, a responsabilidade exclusiva por contestações”. Mas determinou que ele deve responder se há falta de cautela diante de transações visivelmente fraudulentas.

 

No caso, a responsabilidade para o lojista foi mantida, pois a empresa entregou a mercadoria para uma pessoa distinta da que constava no cadastro da loja. Ela também não era a titular do cartão, o que “contribuiu decisivamente para a perpetração da fraude” (REsp 2180780).

 

Em outra ação, cuja relatora foi a ministra Nancy Andrighi, o colegiado entendeu que “a responsabilização exclusiva do lojista só pode ocorrer se esse descumprir as previsões contratuais”. Disseram que a repartição de riscos do negócio é possível, desde que respeitada a boa-fé contratual. Também é preciso garantir o contraditório nessas situações. Nesse caso, a Stone perdeu o recurso (REsp 2151735).

 

No processo do TJSP, a Ticketmaster alegou que a PagSeguro “tem agido de forma contraditória e vem violando as regras e condições gerais para o uso dos seus serviços”. Pediu, além do ressarcimento dos valores retidos, danos morais em R$ 60 mil - a indenização não foi concedida. Já a instituição de pagamento diz não ser responsável pelas contestações dos consumidores.

 

O juiz Baiardo de Brito Pereira Junior, da 14ª Vara Cível, deu ganho de causa à Ticketmaster, mas não chegou a anular a cláusula. “Cabe sempre a ré, ao aplicá-la, comprovar documentalmente a legitimidade da medida adotada, com exibição de prova documental da contestação da operação e do pagamento perante os outros participantes do arranjo de pagamento”, diz.

 

Na segunda instância, o desembargador confirmou o entendimento e declarou a nulidade do chargeback. Na visão de Mac Cracken, é responsabilidade da instituição de pagamento “a conferência da segurança das transações realizadas por meio do produto que oferece, considerando ser ela a detentora das informações hábeis à apuração de eventual fraude”. Ele também levou em conta que a PagSeguro não apresentou provas (processo nº 1093817-29.2022.8.26.0100).

 

“O chargeback é essencial para o funcionamento do arranjo de pagamentos”

— Marco V. Gasparetti

 

O advogado Gabriel de Orleans e Bragança, do SOB Advogados, afirma que essas cláusulas fazem parte da operação de mercado e servem para proteger tanto consumidor final quanto a instituição e pagamento. “Se retira essa cláusula, deixa a instituição de pagamento sem qualquer tipo de segurança de que ela vai ter o reembolso e é ruim para a cadeia como um todo”, afirma. “Se isso se tornar precedente, vai desestimular esse tipo de contratação, porque vai gerar insegurança jurídica”, completa.

 

Já o advogado da Ticketmaster na ação, Renato Montans de Sá, sócio do Montans e Nacle Advogados, defende que o chargeback é uma previsão colocada de maneira unilateral no contrato. “É um contrato feito por eles e, dado o poderio econômico da outra parte, por mais que não seja um contrato por adesão, ou você assina ou não fecha negócio”, afirma ele, acrescentando que só a instituição de pagamento tinha acesso às informações sobre o motivo das contestações.

 

Para ele, é um dispositivo que tem sido usado de forma ilegal. “A retenção desses valores é excepcional porque a regra é a PagSeguro receber e repassar os valores para nós. Só podem fazer o estorno quando existe uma situação de fraude, pagamento em duplicidade ou desistência. Só que eles não conseguiram provar isso no processo”, diz.

 

advogada Carolina Panizzi, do Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados, diz que normalmente as cláusulas não são declaradas nulas por si só. “O STJ trabalha com a questão de liberdade contratual e entende que é preciso analisar o caso concreto, o contrato do lojista com a instituição, quais as responsabilidades de cada um e o que foi feito por parte do lojista para se certificar que a operação estava dentro dos limites”, diz.

 

Segundo o professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Rafael Bianchini, também auditor no Banco Central, as decisões que declaram a nulidade da cláusula são minoria. “Os tribunais veem que está no risco do negócio das credenciadoras e instituições de pagamento, mas elas não podem estipular que não têm responsabilidade alguma sobre as fraudes. Alguma responsabilidade tem que ter.”

 

Se nesses processos, acrescenta, as empresas provarem a “culpa” do lojista ou tomador de serviço, são eximidas da responsabilidade. “Mas o acórdão dá impressão que a cláusula é vedada e não é verdade. É amplamente aceita pelos tribunais, mas tem que olhar o conjunto do contrato”, diz ele, citando decisão do TJSP em que o custo com o chargeback foi dividido entre a instituição de pagamento e o tomador de serviço (processo nº 1012853-46.2018.8.26.0405).

 

Para o advogado da PagSeguro, Marco Gasparetti, do Forbes, Kozan e Gasparetti Advogados, o chargeback é “um elemento essencial para o funcionamento do arranjo de pagamentos”. “Afastar sua aplicação acaba por prejudicar o consumidor final, que passa a ter que ingressar em juízo para invalidar uma compra fraudulenta ou na qual não recebe o produto, ao invés de solicitar o estorno ao emissor do cartão”, afirma ele, acrescentando ter “confiança” que o STJ vai validá-la.

 

Procurada pelo Valor, a PagSeguro não quis comentar o assunto.


Publicado por Valor Econômico.

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