PGFN adota inteligência artificial para gerir execuções fiscais
- Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados

- 7 de nov.
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A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) iniciou formalmente o uso de inteligência artificial (IA) generativa para gerir milhões de execuções fiscais em todo o país.
A ferramenta, batizada de “Spoiler”, foi desenvolvida para antecipar aos procuradores os próximos passos dos processos, otimizando o acompanhamento e reduzindo o tempo gasto com tarefas repetitivas, em um cenário em que tramitam 2,3 milhões de execuções fiscais envolvendo a Fazenda Nacional, com cerca de 5 mil novos processos ingressando por dia, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A aplicação do sistema “Spoiler” insere-se em um movimento mais amplo de modernização do Estado brasileiro, que busca integrar tecnologia e eficiência na cobrança da dívida ativa. O programa é capaz de analisar automaticamente os andamentos processuais, identificar o estágio em que se encontra a execução fiscal e sugerir providências aos procuradores, como a necessidade de peticionar, promover buscas de bens ou propor arquivamento. A ferramenta, portanto, não decide, mas atua como assistente inteligente, sintetizando informações e permitindo que o procurador concentre seu tempo em atividades estratégicas.
Esse tipo de uso da IA está alinhado com experiências já consolidadas no Poder Judiciário, como os sistemas Victoria, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, e Elis, do Tribunal de Justiça de Pernambuco, que utilizam algoritmos para automatizar etapas das execuções fiscais e otimizar a triagem de processos. Estudos como o de Barbon, Neves e Ribeiro (2022) destacam que a baixa efetividade das execuções fiscais — que representam cerca de 35% de todos os processos do Judiciário e possuem taxa de congestionamento superior a 90% — justifica plenamente a adoção de ferramentas tecnológicas voltadas à automação. A inteligência artificial, nesse contexto, surge como meio legítimo e constitucional de aumentar a efetividade da cobrança.
A utilização da IA pela PGFN não é uma medida isolada, mas um reflexo da necessidade de equilibrar celeridade processual, eficiência administrativa e segurança jurídica. O uso de sistemas inteligentes permite, por exemplo, a verificação automática da prescrição intercorrente, a priorização de execuções com maior probabilidade de recuperação e o cruzamento de dados para identificar devedores com patrimônio disponível. Ao mesmo tempo, o modelo adotado pelo órgão observa as diretrizes do Conselho Nacional de Justiça, que determinam que as decisões judiciais e administrativas devem ser supervisionadas por seres humanos, garantindo o princípio do juiz natural e o devido processo legal.
Ainda assim, a inovação traz desafios. A gestão automatizada de processos fiscais exige transparência algorítmica e controle humano constante, de modo a evitar vieses, erros de programação ou interpretações equivocadas de dados processuais. A IA, por mais sofisticada que seja, não é capaz de substituir o discernimento humano na análise das peculiaridades de cada caso — especialmente em situações em que há alegações de nulidades, prescrição ou discussões sobre a legitimidade da cobrança. A função decisória, portanto, permanece indelegável, cabendo à IA o papel de instrumento de apoio técnico.
Ao que tudo indica, a adoção do “Spoiler” representa uma transição importante na forma como o Estado conduz a cobrança da dívida ativa. O potencial de economia de tempo e de recursos é expressivo, e o resultado esperado é uma redução significativa da morosidade que há décadas caracteriza as execuções fiscais. Mais do que um avanço tecnológico, trata-se de um marco de eficiência pública, que reforça o esforço da PGFN tendente à modernização e uso ético da inovação digital no âmbito jurídico.
A experiência, contudo, deve ser acompanhada com prudência: a implantação da inteligência artificial nos processos judiciais e administrativos deve respeitar limites constitucionais e processuais, preservando o contraditório, a ampla defesa e a dignidade da pessoa humana. Quando utilizada como ferramenta de apoio e sob supervisão humana, a IA se mostra um instrumento poderoso para conciliar eficiência com garantias fundamentais, contribuindo para um sistema tributário mais justo, racional e acessível.
A equipe Tributária de Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados acompanha de perto essa evolução tecnológica e coloca-se à disposição para orientar contribuintes e empresas quanto aos impactos da inteligência artificial nos processos de cobrança e execução fiscal.
Luis Felipe Felix




