Implicações Práticas à Efetividade da Cláusula de Non-Competeem Operações de M&A
- Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados

- há 1 dia
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A cláusula de não concorrência (mais comumente chamada de non-compete) é um mecanismo protetivo essencial ao goodwill e ao valor intrínseco do negócio em transações societárias. Sua função primordial é mitigar o risco de que o sócio cedente ou retirante, detentor de know-how estratégico, informações confidenciais e relacionamento com stakeholders, possa desviar a clientela ou competir diretamente com a sociedade remanescente.
Para a validade e executabilidade da cláusula de non-compete, é imperativo o atendimento cumulativo de requisitos formais, visando a redução de ambiguidades e a minimização de riscos de questionamento judicial. Tais requisitos incluem: (i.) delimitação geográfica; (ii.) período de vigência; e (iii.) especificação de atividades. A precisão e o detalhamento na redação são proporcionais à sua segurança jurídica.
No âmbito societário, é de suma importância a correta identificação dos sujeitos passivos da obrigação do non-compete para garantir sua eficácia. Em operações de M&A (mergers and acquisitions em inglês – ou fusões e aquisições em português), não basta limitar a própria empresa vendedora (se for o caso) ou ao sócio principal. O compromisso deve ser estendido aos sócios-chave, administradores e diretores estratégicos que possuíam acesso a informações confidenciais, know-how e, principalmente, ao relacionamento com clientes e fornecedores, bem como a parentes diretos que possam concorrer em nome dos ex-sócios como forma de contornar a restrição. Ainda, a cláusula deve prever a responsabilidade e as penalidades contratuais aplicáveis em caso de quebra do dever de não concorrência.
Embora não exista base legal expressa no Código Civil, a jurisprudência brasileira (apoiada fortemente na analogia com o Direito do Trabalho) já é uníssona no entendimento de que, para que o non-compete seja válido, é igualmente necessário o pagamento de uma remuneração ao ex-sócio ou ex-colaborador submetido à restrição. Essa remuneração deve ser compatível com a remuneração anteriormente recebida (enquanto atuante na sociedade), garantindo assim o sustento do sujeito passivo durante a restrição. A remuneração durante o período da não concorrência é frequentemente balizada com o equivalente a, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) da remuneração anterior.
No contexto de fusões e aquisições, o valor da remuneração paga pelo direito de não concorrência já está usualmente implícito no preço pago pelo comprador aos vendedores. Isto é, o valor pago pela compra da empresa já pressupõe que há uma remuneração embutida para que os fundadores não exerçam atividades concorrentes. Por este motivo, cada vez mais vem ganhando força a existência de cláusulas explícitas sobre um valor específico referente ao non-compete em contratos de compra e venda de quotas/ações – como uma forma de afastar a possibilidade de litígio sob a alegação de inexistência de pagamento de remuneração.
A segregação de um valor específico para a cláusula de não concorrência vai muito além de uma nota de rodapé no contrato de M&A. O valor destinado ao non-compete deve constar expressamente no contrato de compra e venda como uma remuneração pela abstenção de não concorrência (obrigação de não fazer), e não como uma indenização ou parte do preço da venda das quotas/ações. Tal distinção é essencial para a validade perante o Poder Judiciário. Frequentemente, o valor é parcelado ao longo do período da restrição, e o pagamento pode ser suspenso em caso de comprovação de quebra do dever. O parcelamento não só dilui o impacto financeiro para o comprador, mas também funciona como um incentivo para que o sujeito passivo da obrigação mantenha o seu dever de não concorrência.
Em contextos onde o relacionamento pessoal dos fundadores é essencial, o pagamento pelo non-compete garante que o vendedor não se utilize do seu know-how para competir diretamente com o novo dono imediatamente após a conclusão do M&A. Ou seja, esse montante deve ser visto não apenas como parte do preço pela compra das quotas/ações, mas sim como um investimento essencial para blindar o futuro do negócio e restringir o risco de concorrência do vendedor por um tempo determinado e em uma área geográfica específica. Para o comprador, essa quantia representa a aquisição de um ativo estratégico fundamental: a proteção da sinergia, marca, cultura organizacional e da carteira de clientes recém-adquirida.
Em síntese, a cláusula de não concorrência deixou de ser um acessório contratual para se tornar um verdadeiro pilar de proteção societária, especialmente em operações de M&A. Quando bem estruturada — com objeto delimitado, prazo adequado e remuneração proporcional — ela transforma risco em previsibilidade, assegura a integridade do negócio e preserva o valor econômico construído pelas partes. Em um ambiente empresarial cada vez mais competitivo, não se trata apenas de prevenir conflitos: trata-se de garantir que a operação faça sentido no dia seguinte ao fechamento.
Bruna da Costa Gomes e Mariana da Veiga Ribas, sócias do Eichenberg, Lobato e Abreu Advogados.





