O consórcio, quanto à sua natureza, é um contrato de colaboração entre empresas. Com ele, mantendo-se a autonomia e independência patrimonial de cada consorciada, busca-se a aproximação entre as mesmas para uma gestão conjunta de objeto definido.
Assim, diz-se que o consórcio é um contrato de tipo associativo entre empresas através do qual as consorciadas estabelecem uma relação de cooperação, se obrigam nos limites do quanto estabelecido e respondem individualmente por suas obrigações, sem presunção de solidariedade entre as mesmas.
Conforme o § 1º do art. 278 da Lei das Sociedades Anônimas (Lei n. 6.404/76), o consórcio não possui personalidade jurídica autônoma. Ou seja, as consorciadas não criam novo ente ou nova empresa. Ao invés disso, cada participante permanece com sua personalidade jurídica autônoma preservada, seu patrimônio individual e seus respectivos direitos e obrigações apartados.
Ainda que sem personalidade jurídica própria, o consórcio empresarial deve ser registrado na Junta Comercial, na forma do inciso III do art. 4, da Instrução Normativa da Receita Federal nº 1863, de 27 de dezembro de 2018, sendo necessário inscrevê-lo no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), perante a Receita Federal.
Suas características fundamentais são: (i) objeto determinado e (ii) transitoriedade de sua existência ou prazo determinado eis que, atingido o objetivo comum, extingue-se a união.
Desta forma, entende-se que possa ser empregado na execução de empreendimentos com começo, meio e fim, como é o caso de uma incorporação imobiliária.
Portanto, sendo instituído um consórcio para determinada incorporação imobiliária onde existe, como requisito legal, um responsável (o incorporador) e, considerando que o consórcio empresarial não guarda personalidade jurídica, não poderia o consórcio assumir o encargo de incorporador, ainda que inscrito no CNPJ.
No entanto, não existe impedimento na constituição de consórcio para tal finalidade, devendo ser eleita a consorciada líder como a incorporadora, desde que seu objeto social atividades que lhe permitam assumir tal atribuição nos termos da Lei 4.591/64.
Inclusive, sobre este tema, o ilustre Mário Pazutti Mezzari (2015, p. 92) se posicionou da seguinte forma:
“8.12. Consórcio de empresas
A modalidade de Consórcio de Empresas, com o fito de executar obras de construção civil sob a modalidade de incorporação imobiliária ou de execução da obra e de negociação somente após a averbação de habite-se e registro da instituição de condomínio, encontra regulamento na Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 – Lei das Sociedades por Ações – nos artigos 278 e seguintes.
A criação de Consórcio de Empresas para tais finalidades não gera perda nem confusão de personalidade jurídica entre as empresas consorciadas.
O consórcio, por sua vez, não tem personalidade jurídica (CC, artigo 278, § 1º), razão pela qual nem mesmo pode-se cogitar de transferência de imóveis das consorciadas para o consórcio. No entanto, mesmo sem personalidade jurídica, o Consórcio de Empresas tem capacidade contratual e de demandar e ser demandado em juízo.
O contrato de formação do consórcio deverá designar uma Empresa Líder, que será responsável pela escrituração e guarda de livros e documentos.
É no contrato que estarão definidos os direitos e obrigações de cada empresa consorciada, a forma de administração e de representação.
O Consórcio de Empresas deverá ser registrado na Junta Comercial, mediante arquivamento de contrato (CC, artigo 279) e inscrito no Ministério da Fazenda, de onde receberá o respectivo CNPJ.
A constituição do consórcio deverá ser averbada na matrícula do imóvel, com sua designação (se houver) e número de CNPJ (cadastro nacional de pessoa jurídica junto ao Ministério da Fazenda).”
Desta feita, considera-se viável a modalidade, mas ideal que a decisão por sua constituição avalie alguns outros aspectos.
Um deles é o tributário. Registrada a incorporação imobiliária, executado e concluído o empreendimento, as receitas serão reconhecidas na contabilidade de cada uma das consorciadas, não apenas no CNPJ da incorporadora. Deste modo, cada consorciada receberá e lançará as receitas que, respectivamente, lhe competirem eis que empresas independentes entre si, com receitas calculadas individualmente e tributação segregada, sendo relevante avaliar eventual benefício fiscal decorrente do regime especial de tributação, o RET, quando o empreendimento imobiliário possuir patrimônio afetado pois, na forma do artigo 11 da lei 10.931/2004, apenas a empresa que assumir o papel de incorporadora poderá utilizar referido benefício.
Temos, às vezes, duas ou mais incorporadoras unindo-se em consórcio empresarial na intenção de co-incorporar, o que por vezes resulta a) do fato de cada uma ser proprietária de uma fração do terreno onde será erguido o empreendimento; ou b) para empreendimentos multiuso (os supercondomínios), onde cada consorciada aplicará o seu knowhow específico. Ambos os exemplos mostram uma complementariedade nas atribuições, esforços e co-participação dentro do negócio, características inerentes ao consórcio. E, assim, respeitados demais requisitos legais, por estarmos diante de consorciadas incorporadoras, o regime especial de tributação poderá ser aplicável.
Então, por mais que o consórcio empresarial seja viável juridicamente, importante perquirir da viabilidade financeira do mesmo, sopesando os benefícios entre ter, ou não, este contrato de comunhão de esforços em prol de um objetivo específico e com prazo determinado, pois, a uma primeira análise, parece que, enquanto possibilitada tributação pelo regime especial, só haveria vantagem financeira onde as consorciadas forem incorporadoras.
Outro aspecto relevante refere-se aos resguardos face às responsabilidades que podem advir para com os consumidores das futuras unidades autônimas do empreendimento. E, neste âmbito, a melhor proteção vai desde a minuciosa redação do contrato de consórcio, até, e especialmente, a realização de uma due diligence na parceira consorciada, onde importante existir lastro para o cumprimento das suas responsabilidades.
Finalizando, importante esclarecer que a fundamentação da existência de um consórcio empresarial está calcada na presença da colaboração e conjunção de esforços e riscos para ambos os lados. O consórcio artificial cria uma ilusão de eficiência que, na verdade, poderá ser bastante gravosa do ponto de vista tributário com risco de caracterização de uma sociedade de fato.
Gabriela Dornelles
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