Desde há muito nossos Tribunais têm recebido demandas envolvendo a rescisão de contratos de promessa de compra e venda, celebrados no contexto de uma incorporação imobiliária. Pouco a pouco a jurisprudência foi-se ajustando às peculiaridades desse tipo de contrato, até que, nos últimos dias de 2018, sobreveio a regulamentação da matéria na chamada “Lei dos Distratos”, Lei nº 13.786.
Essas demandas envolvem, normalmente, a desistência de parte do promitente comprador e sua intenção em ser restituído do quanto já desembolsado para integrar a incorporação imobiliária.
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, nas últimas décadas, vinha adotando o IGPM como índice hábil à correção monetária de suas condenações. Todavia, nos anos de 2020 e 2021, o IGPM deixou de verdadeiramente representar uma recomposição da perda da moeda no tempo, para passar a representar uma verdadeira fonte de enriquecimento sem causa.
Afinal, é fato notório que o IGPM se desvinculou dos demais índices utilizados para medir a inflação, como o INCC e o IPCA, por exemplo. Enquanto a inflação medida pelo IPCA entre 2020 e 2022 acumulou alta de 16,3%. Não muito distante, o INCC-M no mesmo período acumulou alta de 24,3%. Por outro lado, o IGPM no mesmo período acumulou alta de 49,7%, sendo evidente a discrepância e a verdadeira desvinculação de tal índice com qualquer outro índice de correção monetária no período, o que o torna incapaz de efetivamente medir a inflação e recompor suas perdas.
Diante dessa situação potencializada diretamente pelos efeitos da pandemia de Covid-19, autorizar a correção dos valores a restituir aos promitentes compradores pelo IGPM passou a representar um verdadeiro prêmio pela quebra de contrato; o que significaria provocar um profundo desequilíbrio contratual.
Assim, nosso escritório passou a atuar ativamente junto ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul para que o sinalagma do contrato fosse efetivamente observado, com a aplicação dos índices de correção monetária contratualmente eleitos pelas partes (INCC até o Habite-se, IPCA após o Habite-se), sob pena de provocar gravíssimo prejuízo à toda a incorporação e ao patrimônio de afetação.
Não sendo, pois, o IGPM previsto no contrato firmado pelas partes, tem-se que jamais poderia ser imposto ao promitente comprador durante o cumprimento regular do contrato. Pretender, então, impingir o IGPM ao promitente vendedor absolutamente adimplente, representa inadmissível violação do pacto firmado a agravar os prejuízos do promitente vendedor.
E assim foi que, recentemente, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul alterou seu posicionamento anteriormente consolidado e passou a reconhecer a impropriedade do IGPM para representar a recomposição da perda monetária no tempo, passando a adotar os índices contratualmente eleitos pelas partes para tanto, mantendo-se o equilíbrio do contrato.
Daiana Mallmann