A alienação do bem indivisível objeto de copropriedade foi, por muitos anos, bastante controvertida, pois sob o pretexto de resguardar os direitos do coproprietário não devedor impedia-se a alienação integral do bem, cabendo ao arrematante/adjudicante adquirir o domínio somente da parcela do devedor mantendo-se, dessa forma, o estado de indivisão da coisa e, assim, imputando ao credor/arrematante/adjudicante o ônus de ajuizar ação de dissolução de condomínio, para se chegar àquela mesma fase processual anterior, que é a da alienação do bem em sua totalidade.
Esse procedimento moroso fazia com que a cota parte do devedor, ao ser levada à venda judicial, recebesse propostas bastante aquém de seu valor de mercado, pois haveria necessidade de discutir-se, inclusive, a quem caberia o uso exclusivo do bem indivisível até que fosse, enfim, extinto o condomínio.
Todavia, a jurisprudência passou a ter papel decisivo no sentido de alterar o procedimento e autorizar a alienação integral do bem indiviso e objeto de condomínio de proprietários sem que isso representasse um ônus ao condômino não devedor.
De acordo com a jurisprudência que se consolidava à época, ainda na vigência do Código de Processo Civil de 1973, o legislador incorporou àquele diploma legal o art. 655-B, que passou a autorizar a alienação, por inteiro, do bem indivisível de propriedade comum do devedor e seu cônjuge, protegendo-se a meação deste ao lhe ser destinado parte do valor auferido com a venda.
Seguindo o caminho de buscar dar mais efetividade e celeridade ao processo de execução, sem deixar de resguardar os direitos do coproprietário não devedor, o Código de Processo Civil de 2015 passou a autorizar, também, a alienação integral de Imóveis em outras situações condominiais que não aquela decorrente do regime de casamento, tendo constado no art. 843 do Código de Processo em vigência o que segue:
843. Tratando-se de penhora de bem indivisível, o equivalente à quota-parte do coproprietário ou do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem.
§ 1º É reservada ao coproprietário ou ao cônjuge não executado a preferência na arrematação do bem em igualdade de condições.
§ 2º Não será levada a efeito expropriação por preço inferior ao da avaliação na qual o valor auferido seja incapaz de garantir, ao coproprietário ou ao cônjuge alheio à execução, o correspondente à sua quota-parte calculado sobre o valor da avaliação.
O objetivo da norma em comento foi o de estimular a aquisição do bem indivisível no procedimento de alienação judicial, haja vista que a alternativa – qual seja, a criação de um condomínio entre o cônjuge alheio à execução e o adquirente – despertava pouco ou quase nenhum interesse entre possíveis licitantes.
De outra banda, ainda que vise trazer celeridade e efetividade ao processo de execução, estimulando a aquisição do bem que não comporte cômoda divisão, o procedimento traz segurança ao condômino não devedor, pois este detém o direito de preferência na aquisição da parcela do devedor e, ainda, na hipótese de alienação, tem assegurado o correspondente à sua quota-parte calculado sobre o valor da avaliação.
Ratificando o quanto consta do Código de Processo Civil de 2015, o Superior Tribunal de Justiça decidiu, recentemente, quando do julgamento do Recurso Especial “REsp 1818926/DF”, que é possível a alienação integral do imóvel objeto de condomínio, ainda que a penhora tenha recaído somente sobre a quota parte do devedor, desde que respeitado o quanto previsto no art. 843 do CPC, ou seja, com a garantia (i) do direito de preferência ao condômino não devedor e (ii) do valor da avaliação da parcela do condômino não devedor caso não exercido o direito de preferência.
Ademais, constou no Acórdão proferido no REsp 1818926/DF que se dispensa o protocolo de Embargos de Terceiro pelo condômino não devedor, na medida em que a lei lhe confere proteção automática, tanto pela preferência na arrematação do bem, como pela preservação integral do seu patrimônio, ainda que convertido em dinheiro.
Entendemos que tal decisão é de fundamental relevância para seguir no caminho de maior celeridade e efetividade dos processos de execução, mas principalmente para manter a segurança jurídica do arrematante/adjudicante de imóvel objeto de condomínio sem deixar de lado os direitos do proprietário não devedor que mantém a preferência sobre a quota parte do devedor e, na pior das hipóteses, tem apenas o seu patrimônio convertido em dinheiro.
A decisão prestigia a concretização e materialização da tutela jurisdicional, na medida em que mitiga, em grau mínimo, a relação de terceiro com o bem alienado em detrimento da efetividade da execução. E a aplicação da norma nesse sentido não prejudica o patrimônio do proprietário não devedor, pois, caso, por qualquer razão se sinta lesado por conta do débito do proprietário-devedor, poderá reclamar eventuais prejuízos, desde que comprovados, em ação regressiva, com a ressalva alhures quanto a conversão do patrimônio (quota-parte) em dinheiro.
O ordenamento pátrio prevê que o devedor responde com seu patrimônio sobre os débitos, bem como garante a execução com observância à dignidade humana, porém, tais garantias não se prestam a blindar o devedor de responsabilidade patrimonial de que é responsável, principalmente quando essa imunidade, se encarada com grau instransponível, gera o efeito prático de garantir o inadimplemento, que é uma violação a direito alheio. Por isso, o entendimento adotado é deveras legítimo, por garantir a não dilapidação patrimonial de terceiro não devedor (com a garantia da quota-parte) e permitir a satisfação do crédito do interessado.
Arthur Atavila Casadei Theodoro Focaccia Saibro
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