O programa denominado Minha Casa Minha Vida é desenvolvido pelo Governo Federal e tem como intuito fomentar a construção de moradias populares para pessoas com determinada faixa de renda, permitindo que essas famílias realizem o sonho de morar em uma casa própria.
Notou-se, todavia, aumento nas demandas que versam sobre questões imobiliárias envolvendo unidades do programa mencionado, principalmente as fundamentadas em atraso na entrega da obra, nos quais os autores formulam pedido de indenização pelos lucros cessantes, descrito nos artigos 402 e 403 do CPC. A norma jurídica exige, para que haja o dever de indenizar a título de lucros cessantes, a efetiva demonstração do prejuízo direta e imediatamente decorrente do descumprimento de um contrato.
Diante da multiplicidade de ações e recursos com base no tema acima, com fundamentos idênticos nas questões de direito, houve afetação do tema para julgamento no Superior Tribunal de Justiça, conforme determina o artigo 1.036 do CPC.
O caso afetado para julgamento foi o REsp 1729593 / SP, gerando o Tema Repetitivo 996, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), julgado em 25/09/2019.
Como tese firmada, o STJ determinou que “No caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma.”
Importante ressaltar que por suas peculiaridades, no âmbito do PMCMV, o prejuízo material decorrente do atraso na entrega, aqui classificados como lucros cessantes, possui apenas um objetivo: indenizar o comprador pela privação da fruição do imóvel.
O STJ, indo além, entende que há presunção de prejuízo econômico nestes casos, por isso, não será preciso que o promitente comprador demonstre de maneira inequívoca a finalidade negocial da compra do imóvel, sendo irrelevante que se comprove cabalmente a efetiva perda econômica pela impossibilidade de locação/negociação do bem em razão do atraso na entrega.
Ainda sobre esse tema, outros questionamentos foram levantados, como, por exemplo, a cumulação dos lucros cessantes com a cláusula penal moratória (multa contratual em que m que se estipula, previamente, o valor da indenização que deverá ser paga pela parte em caso de descumprimento do contrato) nos casos de atraso na entrega do imóvel.
Por isso, com Relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, também na Segunda Seção do STJ, REsp 1.498.484-DF julgado em 22/05/2019, firmou-se a tese de que “A cláusula penal moratória tem a finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação e, em regra, estabelecida em valor equivalente ao locativo, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes.”, conhecido como Tema Repetitivo 970.
Com isso, entende-se que a natureza da cláusula penal moratória é reparatória (indenizatória), não havendo sua cumulação com lucros cessantes (que também consiste em uma forma de indenização). Diante desse cenário, existindo cláusula penal no sentido de prefixar a indenização pela mora na entrega do empreendimento, não caberá a sua cumulação com lucros cessantes.
Portanto, atenção! Como não é uma cláusula contratual obrigatória, devemos sempre observar se consta no contrato de compra e venda a cláusula penal moratória, e em caso positivo, deve-se atentar que apenas o valor estipulado como multa nesta cláusula será revertida em favor do promitente comprador (que usualmente é aplicada no percentual de 0,5%), sendo inviável cumulação desta com valores à título de lucros cessantes, sob pena de enriquecimento ilícito.
Elisa Sequeira D’Avila