Aspectos do Direito de PreferĂȘncia no Contrato de Arrendamento Rural
- Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados
- 30 de nov. de 2022
- 3 min de leitura
Ă consabido que o Estatuto da Terra e o Decreto 59.566/66 contĂȘm diversas normas que visam a proteção do sujeito que trabalha na terra, utilizando-a para criação de animais, para cultivo de alimentos, extração, etc.
Dentre os direitos conferidos ao arrendatĂĄrio rural, pelos mencionados diplomas legais, podemos citar o direito de preferĂȘncia na aquisição do imĂłvel arrendado, o qual se consubstancia mediante a obrigação que o proprietĂĄrio de imĂłvel rural tem, ao pretender alienar a sua propriedade, de notificar o arrendatĂĄrio de sua intenção, informando-o das propostas recebidas e das condiçÔes do negĂłcio, tais como preço, prazos, indexadores e outros. Sugere-se que, para que nĂŁo haja dĂșvidas acerca do recebimento da notificação, que ela seja feita atravĂ©s do CartĂłrio de TĂtulos e documentos ou por via judicial. Recebida a notificação, o arrendatĂĄrio deverĂĄ se manifestar sobre a proposta no prazo de 30 dias.
Importante aspecto a ser lembrado Ă© o de que, conforme firme jurisprudĂȘncia, o direito de preferĂȘncia Ă© somente conferido Ă quele que explora diretamente a terra, nĂŁo se estendendo, portanto, Ă quele que subarrenda a terra a terceiro, assumindo, entĂŁo, em Ășltima anĂĄlise, a posição de arrendador (em relação ao subarrendatĂĄrio). Portanto, havendo subarrendamento da ĂĄrea rural, o direito de preferĂȘncia Ă© conferido ao subarrendatĂĄrio, que Ă© o cultivador direto da terra, nela trabalha e investe sua força e capital, conferindo a ela sua função social.
No caso de haver vĂĄrios arrendatĂĄrios no imĂłvel, a notificação acerca da intenção de venda deverĂĄ ser enviada a todos eles. E aquele que tiver interesse na aquisição, deverĂĄ exercĂȘ-lo em relação a todo o imĂłvel e nĂŁo apenas quanto Ă ĂĄrea que ele ocupa. Ainda, se mais de um arrendatĂĄrio manifestar interesse na aquisição, hĂĄ previsĂŁo de preferĂȘncias, mediante critĂ©rios a serem seguidos, em ordem, como, em primeiro lugar, o arrendatĂĄrio que tiver benfeitorias de maior valor ou, nĂŁo sendo o caso, o que arrendar quinhĂŁo mais extenso. Permanecendo ainda assim indefinida a disputa, prevalecerĂĄ o que oferecer melhor preço/condiçÔes.
Outros dois relevantes aspectos igualmente jĂĄ enfrentados pelo Superior Tribunal de Justiça em relação ao direito de preferĂȘncia no arrendamento rural dizem respeito Ă necessidade ou nĂŁo de registro do contrato de arrendamento para exercĂcio do direito e Ă sua aplicação em caso de alienação judicial. Em relação ao registro, o STJ jĂĄ se manifestou no sentido de que nĂŁo se faz necessĂĄrio o registro do contrato de arrendamento na matrĂcula do imĂłvel arrendado para o exercĂcio do direito de preferĂȘncia. Quanto Ă s alienaçÔes judiciais, o posicionamento do Tribunal Superior Ă© de que, sem ter o legislador restringido as formas de alienação das quais exsurgiria o direito de preferĂȘncia, inviĂĄvel excluir do seu alcance a alienação coativa ou judicial (REsp 1.148.153/MT, 3ÂȘ. T. j. 20.3.2012, rel. Min Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 12.4.2012).
Por outro lado, a aplicação do direito de preferĂȘncia nos contratos de parceira rural, os quais sĂŁo igualmente contratos tĂpicos regulados pelo Estatuto da Terra, mas que contĂ©m algumas caracterĂsticas diversas, Ă© um tema que divide os juristas. Isso porque o Estatuto da Terra nĂŁo prevĂȘ expressamente o direito de preferĂȘncia em relação ao contrato de parceria. Entretanto, os doutrinadores que defendem sua extensĂŁo Ă parceria o fazem com base no art. 96, inciso VII do mencionado Estatuto, o qual prevĂȘ a aplicação, na parceria agrĂcola, pecuĂĄria, agropecuĂĄria, agroindustrial ou extrativa, das normas pertinentes ao arrendamento rural, no que couber, bem como das regras do contrato de sociedade, naquilo que nĂŁo estiver regulado por aquele diploma.
A questĂŁo jĂĄ foi enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça que se manifestou contrĂĄrio Ă extensĂŁo do direito de preferĂȘncia, em caso de venda do imĂłvel rural, aos contratos de parceria, no julgamento do REsp 264.805/MG, da relatoria do Min. Cesar Asfor Rocha.
Finalmente, para exercer seu direito de preferĂȘncia, caso nĂŁo tenha recebido a necessĂĄria notificação prĂ©via do arrendador, o arrendatĂĄrio deverĂĄ propor ação judicial por meio da qual pleitearĂĄ a anulação do negĂłcio de compra e venda a terceiro, bem como a adjudicação do imĂłvel em seu favor. Para essa finalidade, Ă© imprescindĂvel que ele deposite em juĂzo o preço do imĂłvel, fazendo valer seu direito de preferĂȘncia na aquisição, nas mesmas condiçÔes ofertadas pelo terceiro.
Conforme visto acima, trata-se de faculdade conferida ao arrendatĂĄrio rural pela lei especial (Estatuto da Terra), visando proteger aquele que jĂĄ se encontra trabalhando e tirando seu sustento da propriedade rural.
Como se vĂȘ, portanto, vĂĄrios debates exsurgem apenas de um direito (preferĂȘncia) consagrado pelo Estatuto da Terra, em relação ao contrato de arrendamento rural, o que demonstra a riqueza do tema e a importĂąncia de que as partes sejam devidamente orientadas quanto Ă s caracterĂsticas e efeitos dos contrĂĄrios agrĂĄrios que venham a firmar, sejam eles tĂpicos ou atĂpicos.
Renata Silva Fagundes