O cálculo do gross up é parte constituinte da rotina das empresas, seja para determinar a precificação de um produto ou serviço, de modo a atender a devida calibragem do preço frente aos custos do negócio, à concorrência ou, enfim, à realidade do mercado, seja em razão de imposição legal, como é o caso, por exemplo, do cálculo do ICMS “por dentro”.
Em linhas gerais, a técnica permite a incorporação do tributo ao preço final de venda de determinada mercadoria. Exemplo disso é a típica operação de circulação de mercadoria, submetida ao ICMS sob alíquota de 18%, calculada por dentro. Nesse caso, uma mercadoria de R$ 100,00, livre de impostos, passa a ser, com o tributo adicionado, R$ 121,95 (100 /1-0,18). Até aqui, nenhuma novidade. Nesse caso, a alíquota nominal corresponde a 18%, ao passo que a alíquota efetiva equivale a 21,95% A operação examinada ocorre em conformidade com a legislação e com as balizas estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 214, da Repercussão Geral[1].
O sistema tributário brasileiro é dinâmico e complexo, as incidências descritas na legislação são, no mais das vezes, imbricadas e objeto de sucessivas modificações pelo legislador.
Mostra disso é a alteração promovida pela Lei 14.592/2023, que modificou a legislação aplicável ao PIS e à COFINS e excluiu, da base de cálculo dessas contribuições, os valores correspondentes ao ICMS.
Em primeira leitura, tem-se a ideia de que o legislador buscou harmonizar a legislação ao entendimento preconizado pelo STF, no âmbito do Tema 69, da Repercussão Geral, que determinou a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS. De fato, o STF determinou a exclusão do ICMS destacado em nota, da base de cálculo do PIS e da COFINS incidentes sobre a receita bruta dos contribuintes.
A Lei 14.592/2023, todavia, foi além e ordenou a exclusão, da base de cálculo do PIS (Lei 10.637) e da COFINS (Lei 10.833), o “ICMS que tenha incidido sobre a operação”.
A exclusão do ICMS destacado, da base de cálculo do PIS e da COFINS incidentes sobre a receita bruta, não implicava maiores repercussões sobre o preço da mercadoria, já que a sua operacionalização dependia, exclusivamente, da segregação do ICMS destacado da receita bruta auferida pela empresa.
A Lei 14.592/2023, art. 6º e art. 7º, ao dispor que , da base de cálculo do PIS e da COFINS, tenha de ser excluído o “ICMS que tenha incidido sobre a operação”, passou a permitir a conclusão de que o ICMS a ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS é aquele ICMS calculado por dentro, mediante gross up. No limite, há com isso o potencial de modificar, para menos, a própria receita bruta tributável da empresa.
A discussão acerca do gross up também suscita dúvidas em relação à interpretação da legislação disposta na Lei 14.592/2023, especialmente no que toca à produção de efeitos sobre o Tema 69, do STF. Não há definição, no âmbito administrativo ou judicial, acerca da possibilidade de recálculo de valores recuperados pelos contribuintes, em razão do Tema 69, do STF, motivados pela exclusão do ICMS calculado por dentro.
Edmundo Cavalcanti Eichenberg
Marcelo Czerner
[1] Tese: É constitucional a inclusão do valor do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS na sua própria base de cálculo;
RE 582461, Min. Rel. Gilmar Mendes, julgado 18.05.2011, DJe 18.08.2011.
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