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Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados - Especialista em Direito Imobiliário

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AREsp nº 2.159.312/SP, um importante precedente para a Securitização no País

Nas últimas décadas, o financiamento privado se tornou um dos principais meios de custeio de projetos em países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Isso ocorre pelo fato dessa modalidade de financiamento exigir uma legislação madura, com a previsão de mecanismos de segurança, que garantam ao financiador/investidor a certeza do retorno do valor desembolsado.


A operação de securitização de recebíveis, que teve origem nos Estados Unidos, é um dos exemplos do desenvolvimento dos meios de financiamento privado. No Brasil, esse tipo de operação alavancou diversos empreendimentos na área imobiliária, permitindo que incorporadoras buscassem crédito diretamente com investidores no mercado de capitais.


A lógica da securitização é simples, e permite que as empresas que buscam financiamento (originador), e que possuam créditos futuros a receber (recebíveis), cedam definitivamente estes créditos, com garantias, a uma companhia securitizadora, que irá transformar os recebíveis em um valor mobiliário, denominado de Certificado de Recebíveis, que será negociado junto a investidores, dispostos a investir/financiar o projeto da empresa. Assim, o Certificado de Recebível se torna um investimento, lastreado nos créditos originários. Portanto, o papel da securitizadora é receber, através da cessão definitiva, os créditos da empresa originadora, e transformá-los em um investimento, protegido pelas garantias também cedidas na operação.


Destacamos que a expansão da securitização veio na esteira da modernização da legislação brasileira, com a previsão legal da instituição do patrimônio separado na emissão dos Certificados de Recebíveis, visando a proteção do investidor.


O caminho para a segurança jurídica e a proteção dos recebíveis e das garantias vinculados à operação passou por altos e baixos em nossa legislação. Lembramos que, inicialmente, a Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, previa na Seção IV a instituição do Regime Fiduciário, contemplando em seu artigo 11, que os créditos imobiliários, juntamente com as garantias da operação, constituíam patrimônio separado, que não se confundia com o da companhia securitizadora, destinados, exclusivamente, à liquidação dos títulos a que estivessem afetados, estando, portanto, protegidos de qualquer ação ou execução pelos credores da companhia securitizadora. Mas, em 2001, foi editada a Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, dispondo, em seu artigo 76, sobre a possibilidade de desconstituição do regime fiduciário, atingindo o patrimônio separado, em caso de débitos de natureza fiscal, trabalhista e previdenciária da companhia securitizadora, se tornando um novo fator de risco para as operações.


Apenas duas décadas depois, a Lei nº 14.430, de 03 de agosto de 2022, originada através da Medida Provisória nº 1.103, de 15 de março de 2022, foi publicada e, por meio do parágrafo 4º, do artigo 27, garantiu a proteção do patrimônio separado, inclusive contra débitos de natureza fiscal, previdenciária e trabalhista.


Dessa forma, com a expansão da securitização e o amadurecimento da legislação, esperava-se também, um aumento no número de litígios, levando a diversos questionamentos jurídicos, e não apenas a questão do patrimônio separado, para manifestação do poder judiciário, aumentando a apreensão por decisões que favorecessem a operação de securitização.


Como esperado, recentemente, a importância da securitização imobiliária, seu real escopo e reflexos no mercado financeiro, foram observados no Superior Tribunal de Justiça, que, ao julgar processo movido por consumidores adquirentes de imóvel contra companhia securitizadora (AREsp nº 2.159.312/SP), reconheceu a inexistência de vínculo jurídico entre estas partes.


No caso julgado, compradores propuseram ação em face da construtora e da companhia securitizadora, buscando rescindir compromisso de compra e venda de imóvel e reaver parte das parcelas pagas. A companhia securitizadora foi incluída no polo passivo porque adquiriu da construtora, por meio de cessão de créditos, os créditos oriundos do contrato de compra e venda celebrado entre a construtora e os compradores.


Em primeira instância, o juízo rejeitou a alegação de ilegitimidade da securitizadora, fundamentando que ela integraria a cadeia de consumo na relação formada entre as partes, entendimento este que foi mantido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.


O Superior Tribunal de Justiça, entretanto, deu provimento ao recurso da securitizadora, para reconhecer sua ilegitimidade para responder à demanda do processo movido, ou seja, reconheceu que não havia relação jurídica entre os compradores e a empresa que realizou a operação de securitização.


A decisão é irretocável e deve ser não só prestigiada como também observada pelos demais órgãos do judiciário. De fato, ainda que a existência de uma relação de consumo amplie a responsabilidade dos fornecedores perante o consumidor, essa espécie de relação jurídica de direito material não é ilimitada.


A cadeia de consumo existe a partir de um produto ou serviço pelo qual se vinculam o consumidor, que o adquire, e o fornecedor, que o oferece no mercado. Na compra e venda de unidades imobiliárias, o produto é o imóvel, ou seja, somente pode se instaurar uma cadeia de consumo entre aqueles que atuaram no contrato de venda desse imóvel.


Qualquer outra relação jurídica alheia à compra e venda da unidade, tal como o é a securitização realizada diretamente entre vendedora e securitizadora, não integra a cadeia de consumo, como bem salientado pelo STJ.


Antecipando qualquer argumento em sentido contrário, conjecturando uma possível fragilização do consumidor, é preciso destacar que a desvinculação entre as relações tem caráter dúplice, ou seja, tal como a securitizadora não se responsabiliza perante o consumidor, este também não pode se ver prejudicado em razão – qualquer que seja – do negócio realizado entre a construtora e a securitizadora.


Finalmente, é inegável a importância do precedente criado pelo STJ, aumentando o grau de segurança jurídica das operações de securitização no País, ao impedir a responsabilidade das companhias securitizadoras na questão consumerista abordada no processo, o que, definitivamente, agrada aos investidores, que poderão, cada vez mais, optar pelo investimento nesta fundamental operação de financiamento privado.


Arthur Atavila Casadei

Felipe Costa Holanda

Mariana Trica

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