Viagem internacional, previdência: como aliviar o aumento do IOF
- Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados
- há 6 dias
- 7 min de leitura
Compras internacionais, empréstimos, investimentos em VGBL e até serviços de nuvem ficaram mais caros; entenda o que mudou e como reduzir o impacto no bolso
A decisão do Ministério da Fazenda de aumentar o Imposto sobre Operações Financeiras, o IOF, apesar de já estar em vigor, ainda enfrenta resistência vinda de várias frentes. Entre elas, parte do Congresso, do setor financeiro e da pessoa física que tem alguns tipos de investimentos, despesas em moeda estrangeira ou vai viajar para o exterior.
TAXA ELEVADA DE CRESCIMENTO
As novas regras do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), em vigor desde a publicação dos Decretos nº 12.466 e nº 12.467 de 2025, pegaram empresas e consumidores de surpresa com uma alta expressiva nas alíquotas.
O governo federal justifica a medida com argumentos técnicos e regulatórios. No entanto, especialistas alertam que o real objetivo parece ser arrecadatório, o que pode abrir brechas para contestação judicial.
Seja no cartão de crédito, na despesa ou compra de moeda estrangeira, em empréstimos ou investimentos, o impacto será generalizado. “Todos nós, sem exceção, vamos sentir. Ou o empresário repassa o custo ou deixa de investir. E o consumidor paga a conta”, resume Elias Menegale, do Paschoini Advogados.
O ANTES E O DEPOIS DA ALÍQUOTA
Antes do Decreto nº 12.466/2025, publicado na última quinta-feira e que já está em vigor, as alíquotas do IOF para financiamentos tomados por empresas eram de 0,0041% ao dia, até o limite de 1,4965% no ano (365 dias), mais a alíquota adicional de 0,38% na contratação, totalizando uma carga tributária de 1,88%.
A partir do novo decreto, as alíquotas subiram para 0,0082% ao dia, até o limite de 2,993% ao ano (365 dias), mais a alíquota adicional de 0,95% na contratação, totalizando uma carga tributária de 3,95%.
Para empresas optantes pelo Simples Nacional, o IOF nos financiamentos era de 0,00137% ao dia, até o limite de 0,5% ao ano (365 dias), mais a alíquota adicional de 0,38% na contratação, totalizando uma carga tributária de 0,88%.
O decreto provocou o aumento nas operações com optantes do Simples para uma alíquota de 0,00274% ao dia, até o limite de 1% ao ano (365 dias), mais a alíquota adicional de 0,95% na contratação, totalizando uma carga tributária de 1,95%.
“Trata-se de um aumento de mais de 200% em alguns casos. Isso encarece o crédito, reduz competitividade e impacta preços de produtos e serviços”, explica Edmundo Eichenberg, do Eichenberg Lobato Abreu & Advogados.
CARTÃO DE CRÉDITO E COMPRAS NO EXTERIOR
As compras internacionais feitas com cartão de crédito, cartões pré-pagos ou contas em fintechs globais (como Wise, C6 Conta Global e Avenue) agora têm a mesma alíquota: 3,5% de IOF. Antes, o percentual era de 3,38% no cartão e 1,1% nas remessas para contas no exterior.
“O governo eliminou a diferença de tratamento tributário entre essas formas de pagamento. A unificação favorece a arrecadação e dificulta estratégias de economia por parte do consumidor”, aponta Frederico Fonseca, do Rolim, Goulart, Cardoso Advogados.
INVESTIMENTOS GLOBAIS
A situação dos investidores se tornou mais complexa e desigual, avaliam alguns especialistas.
Inicialmente, o Decreto nº 12.466/2025 previa a elevação da alíquota do IOF para 3,5% em todas as remessas ao exterior feitas por pessoas físicas, inclusive para investimentos em contas internacionais ou corretoras estrangeiras.
“No entanto, diante da repercussão negativa e do risco de fuga de capitais, o governo recuou parcialmente e decidiu manter a alíquota de 1,1% para essas remessas de investimento feitas por pessoas físicas”, comenta Júlio César Soares, da Advocacia Dias de Souza, que detalha:
1 - Pessoas físicas que enviam dinheiro para o exterior com o objetivo de investir diretamente (como por exemplo, comprar ações no exterior, manter recursos em dólar e aplicar em ETFs) continuam pagando apenas 1,1% de IOF;
2 - Já outras operações de câmbio de pessoas físicas — como remessa para conta própria sem finalidade de investimento, pagamento de serviços no exterior, envio para terceiros, ou uso de cartão internacional — continuam sujeitas à alíquota majorada de 3,5%.
O governo, no entanto, manteve a isenção total para fundos brasileiros regulados que aplicam no exterior — ou seja, fundos de investimento operados por gestoras nacionais que já faziam alocação internacional seguem isentos.
REFLEXOS NA PRÁTICA
Esse cenário cria, na prática, três realidades distintas para quem investe fora do país:
1 - Investidores pessoa física com acesso direto a contas ou corretoras no exterior: alíquota de 1,1% (recuo confirmado).
2 - Fundos brasileiros com alocação internacional (estruturas reguladas): alíquota zero.
3 - Pessoas físicas que realizam remessas para outros fins ou utilizam cartão internacional: alíquota de 3,5%.
“Essa diferenciação, embora alivie parte da classe média investidora, mantém um sistema desigual, pois beneficia ainda mais quem investe por meio de estruturas complexas (fundos, offshores, veículos blindados), e onera os consumidores comuns em situações não necessariamente ligadas a riqueza ou patrimônio”, frisa Soares.
SHEIN, AMAZON, SHOPEE
Se o consumidor fizer compras internacionais em plataformas multinacionais, como Shein, Amazon e Shopee, haverá a incidência do IOF, com a alíquota de 3,5%.
Porém, se as compras forem realizadas no Brasil, com pagamento em reais, sem operação de câmbio, não haverá a incidência do imposto.
No entanto, há outras contas que podem ficar mais altas. Serviços como Google Drive, iCloud e licenças de software devem sofrer com a incidência de IOF de 3,4% sobre o valor da compra. Vale lembrar, no entanto, que empresas e instituições financeiras podem decidir absorver o aumento de custo para seus clientes, ainda que temporariamente, como forma de retê-los.
MOEDA EM ESPÉCIE: IOF TRIPLICADO
Para quem compra dólar ou euro em espécie, a alíquota saltou de 1,1% para 3,5%. A prática continua comum em viagens, especialmente para quem busca praticidade e segurança.
“Mesmo com o crescimento das contas digitais, muitos ainda optam por levar moeda em espécie, o que agora pesa mais no bolso”, diz Jéssica Lazzari, do escritório Rossi, Maffini, Milman.
A alíquota representa exatamente o quanto o câmbio líquido precisa ser majorado, para que o imposto possa ser apurado e pago em cada operação de compra de moeda, diz Eichenberg, que exemplifica: compra de US$ 1.000, com cotação líquida de IOF de R$ 5,64. O IOF será de R$ 197,40 (3,5% de R$ 5.640,00). A cotação final será de R$ 5,8374.
INVESTIMENTOS: VGBL É O MAIOR ALVO
O único investimento diretamente afetado pelas novas regras foi o plano de previdência VGBL. A partir de agora, aportes mensais acima de R$ 50 mil por CPF são tributados com 5% de IOF.
“O investidor que aplica R$ 100 mil por mês, por exemplo, terá de pagar R$ 2.500 de IOF. E isso se renova todo mês, não é parcela única”, alerta Menegale.
Para mitigar, a orientação é fracionar os aportes e avaliar outras estruturas previdenciárias. “A medida afeta poucos, mas representa um recado simbólico do governo”, afirma Soares.
O QUE FICOU DE FORA
Algumas operações foram excluídas do aumento:
1 - Remessas de pessoa física ao exterior com finalidade de investimento (seguem com IOF de 1,1%);
2 - Fundos brasileiros que aplicam no exterior (seguem isentos);
3 - Fies, programas sociais, investimentos em infraestrutura, compras de veículos por PCDs e transferências entre instituições financeiras.
“A decisão de manter a alíquota de 1,1% para remessas de investimento foi resultado da forte reação do mercado e evita fuga de capitais”, explica Soares.
COMO REDUZIR OS IMPACTOS
Mesmo com pouco espaço para driblar a alta do IOF, por se tratar de imposto federal, algumas estratégias ajudam a mitigar os efeitos:
1 - Negociar taxas com operadoras e planejar gastos no exterior;
2 - Utilizar contas globais com câmbio competitivo e evitar parcelamentos longos;
3 - Fracionar aportes em previdência para não ultrapassar o limite de R$ 50 mil mensais; e
4 - Avaliar se o VGBL continua sendo a melhor opção para seu planejamento patrimonial.
A DISPUTA DO IOF EM BRASÍLIA
Enquanto os afetados pelas novas regras do IOF tentam encontrar formas de minimizar o aumento dos custos, as peças principais do tabuleiro tentam negociar mudanças. Na quarta-feira (28), presidentes dos quatro maiores bancos do país, junto da Febraban, que representa o setor, estiveram no Ministério da Fazenda para negociar.
Ao final do encontro, o secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan, disse que a Fazenda está disposta a discutir alternativas a alguns pontos específicos das alterações do IOF.
“A Febraban nos traz o impacto das medidas no setor, de maneira legítima, de maneira bem racional, de maneira detalhada. A gente discutiu alternativas também apresentadas pela Febraban, e outras que a gente trouxe para o debate. É natural que a gente avance nesse debate sobre o que poderia ser uma alternativa a itens isolados desse ajuste no IOF”, declarou Durigan na saída da reunião da qual participaram os presidentes do Santander, Bradesco, BTG Pactual e Itaú Unibanco.
O PESO SOBRE AS PMES
Já Isaac Sidney, da Febraban, disse que os bancos têm mantido o diálogo com o Ministério da Fazenda desde o anúncio, na semana passada. O objetivo da reunião, completou, foi compartilhar com a pasta os impactos calculados, particularmente em relação às operações de crédito.
“Nós mostramos para o ministro Haddad e para seus secretários que o impacto é severo, é um impacto para o crédito das micro, pequenas e médias empresas”, disse o presidente da Febraban.
Durigan no entanto, ponderou os efeitos de novas mudanças nas regras do imposto. “Se essa medida do IOF for alterada, como foi alterada na quinta-feira, ela traz um ajuste em termos de como você executa o orçamento e isso pode trazer, automaticamente — não é por uma decisão nova do governo, da Junta de Execução Orçamentária — impactos para o contingenciamento e para o bloqueio”, declarou aos jornalistas.
Enquanto isso, o ministro Fernando Haddad segue em negociação com os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB) depois do aumento da pressão em torno da votação de projetos de decreto legislativo (PDLs) para suspender os efeitos da medida da Fazenda.
Edmundo Cavalcanti Eichenberg
Publicado por Fast Company Brasil.