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Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados - Especialista em Direito Imobiliário

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Publicada Lei Complementar nº 208/2024 que altera Regras para Cessão de Créditos

A Lei Complementar nº 208, sancionada em 2 de julho de 2024, trouxe alterações significativas às Leis nº 4.320/1964 e 5.172/1966 (Código Tributário Nacional), conferindo aos entes federados o direito de cessão onerosa de direitos oriundos de créditos tributários e não tributários, adicionando hipótese de interrupção da prescrição para ação de cobrança de crédito tributário, e autorizando a administração tributária a requisitar informações a entidades e órgãos públicos ou privados. Tais mudanças podem gerar dúvidas e conflitos quanto à maneira de sua aplicação prática, em razão da complexidade dos temas abordados e da maneira pouco específica da qual a legislação utiliza para abordá-las.


Hipóteses de Interrupção da Prescrição para Ação de Cobrança de Crédito Tributário


Tratando das hipóteses de interrupção da prescrição para ações de cobrança de crédito tributário, estas encontram-se previstas no artigo 174, parágrafo único, do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966), que, até a vigência da referida Lei Complementar, elencava 4 situações em que restava interrompida a prescrição, quais sejam: o despacho do juiz que ordenasse a citação em execução fiscal; o protesto judicial; o ato judicial que constituísse em mora o devedor; e o ato inequívoco que, ainda que extrajudicial, importasse em reconhecimento do débito pelo devedor. Após a publicação da Lei Complementar nº 208/2024, entretanto, assim restaram previstas as hipóteses citadas anteriormente:


Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.


Parágrafo único. A prescrição se interrompe:


I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005)


II - pelo protesto judicial ou extrajudicial; (Redação dada pela Lei Complementar nº 208, de 2024)


III - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;


IV - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor. 


(Grifou-se)


Note-se que a Lei Complementar supra referida acrescenta a realização de protesto extrajudicial como hipótese de interrupção da prescrição da dívida tributária. Dessa forma, títulos executivos extrajudiciais, isto é, que não tenham sido constituídos por meio da atuação jurisdicional, a exemplo da Certidão de Dívida Ativa (CDA), ao serem protestados, ensejarão, a partir de agora, a interrupção da prescrição do direito de cobrança sobre os créditos tributários a que se referem.


Tal alteração é extremamente benéfica à Administração Pública, uma vez que aumenta o período pelo qual possui o direito de cobrar créditos oriundos de título extrajudicial, com a realização do referido protesto. Além disso, a alteração do dispositivo legal casa com entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o Tema 1.184, fixando Tese de Repercussão Geral que vai ao encontro da modificação legislativa trazida pela Lei Complementar.


O STF, ao julgar o Tema de Repercussão Geral, fixou tese no sentido de que só pode ser ajuizada execução fiscal que objetive o adimplemento de crédito tributário de baixo valor, diante do cumprimento de alguns requisitos, entre eles, conforme o item 2 da tese fixada, o protesto do título a ser executado. O que ocorre é que o STF não fixou critérios para a determinação do “baixo valor” referido, de modo que muitos magistrados têm optado pela extinção de execuções fiscais que considerem de valor ínfimo ou irrisório.


Assim, com a alteração legislativa em tela, além de interromper a prescrição tributária sobre o crédito a ser executado, o ente público cumpre requisito indispensável ao ajuizamento de execução fiscal, quando efetua o protesto de título extrajudicial.


Deve-se prestar atenção, entretanto, aos pontos sobre os quais a legislação não versou em relação ao protesto extrajudicial, quais sejam, os dois principais: a realização de protesto durante o curso da execução fiscal; e a possibilidade de retroatividade dos efeitos da nova lei. Ao promover alteração nas previsões legais do artigo 174, parágrafo único, do CTN, a Lei Complementar nº 208/2024 não versou sobre esses dois tópicos, que com certeza serão objeto de discussão futura.


Principalmente quanto ao segundo tópico apontado, é fundamental que se defina regra específica quanto à retroatividade nesses casos, uma vez que, caso nada disponha a lei acerca da aplicação retroativa do novo dispositivo legal, conviver-se-á com uma série de execuções fiscais ajuizadas por entes federados, visando o adimplemento de créditos tributários já prescritos, em virtude de protesto efetuado anteriormente à prescrição, o que fere diretamente os princípios da segurança jurídica e da irretroatividade da lei, ambos norteadores das relações jurídicas estabelecidas entre contribuintes e entes federados.


Além disso, é de suma importância que a legislação verse sobre a possibilidade de protesto extrajudicial no curso da execução fiscal, tanto para fins de aplicação do disposto na Lei Complementar nº 208/2024, quanto em relação aos requisitos elencados pelo STF na apreciação do Tema de Repercussão Geral 1.184.


Assim, conclui-se que a alteração trazida pela Lei Complementar em tela é benéfica aos entes federados, trazendo maior certeza e liberdade quanto à possibilidade de cobrança de créditos tributários, sem que ocorra a prescrição destes. Entretanto, é fundamental que se regulamente as questões que ainda deixam dúvida quanto às formas de sua aplicação, a fim de evitar que ocorra manifesto abuso de direito por parte dos municípios, estados e União, diante da relação estabelecida com os contribuintes.


Cessão Onerosa de Direitos Creditórios Originados de Créditos Tributários ou Não


A Lei Complementar nº 208/2024, em seu artigo 1º, também promoveu mudança na Lei nº 4.320/1964, acrescentando o artigo 39-A ao seu corpo. Tal artigo determina que os entes federados podem ceder onerosamente, respeitadas as condições estabelecidas nessa lei e em legislação específica, direitos originados de créditos tributários e não tributários, a pessoas jurídicas de direito privado e a fundos de investimento que são regidos pela regulamentação da Comissão de Valores Imobiliários (CVM).


A referida cessão possui características e condições estabelecidas pelos parágrafos do referido artigo. O parágrafo primeiro, em suma, prevê que os créditos que originarem o direito cedido devem ter sua natureza mantida, de modo que as características e prerrogativas inerentes ao crédito constituído continuem as mesmas, garantindo ao ente público a prerrogativa de cobrança (judicial e extrajudicial) dos créditos, isentando-o, porém, de responsabilidade, compromisso ou dívida decorrentes dos direitos cedidos.


O § 1º prevê, em síntese, a preservação: da natureza do crédito oriundo do direito cedido; dos critérios de atualização e correção de valores aplicáveis a tal crédito; e das prerrogativas de cobrança disponibilizadas aos entes federados para a cobrança dos créditos. 


Os demais parágrafos do artigo 39-A da Lei nº 4.320/1964 estabelecem condições, limitações, e critérios a serem adotados e observados quando efetuada a cessão desses direitos. Um exemplo claro, e, uma das principais vedações, é a impossibilidade de uma instituição financeira controlada pelo ente federado cedente participar de aquisição primária dos direitos creditórios, participar de negociação referente a esses direitos no mercado secundário, ou realizar operação lastreada, ou garantida pelos direitos creditórios desse ente, nos termos do disposto no § 8º do referido artigo.


A Lei Complementar autoriza, também, a criação de uma sociedade de propósito específico, criada pelo ente cedente exclusivamente para esse fim, para que seja intermediada a cessão de direitos, hipótese em que restaria dispensada a licitação, conforme dispõe o § 7º do mesmo art. 39-A, introduzido na Lei nº 4.320/1964. Também, nos termos do § 10 do mesmo dispositivo, é determinado que as cessões ocorridas anteriormente à publicação de lei federal, estadual, distrital ou municipal limitar-se-ão ao estoque de créditos existentes até a data de publicação destas, que concederão a autorização legislativa para tal operação.


Dessa forma, pode-se concluir que a alteração trazida pela LC nº 208/2024 serve como uma maneira de permitir à Administração Pública a antecipação de recebíveis tributários, uma alternativa eficiente para a capitalização dos entes federados, uma vez que negociam os direitos a receber que possuem, em troca de prestação onerosa por parte do adquirente. 


Tal alteração, entretanto, assim como a citada anteriormente, é uma regra geral, e necessita de leis específicas que autorizem e regulem os diferentes casos de aplicação da operação de cessão de direitos creditórios, sob pena de causar, futuramente, litígios entre os adquirentes dos direitos e os entes cedentes, em razão da falta da especificação quanto às normas gerais dispostas, que pode ocasionar benefícios excessivos aos entes federados, em detrimento das pessoas jurídicas de direito privado que tiverem interesse na aquisição dos direitos aqui citados.


Francisco Mussnich da Cunha

Edmundo Cavalcanti Eichenberg

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