Neste mês de outubro, através de seu Pleno, e por maioria, o Tribunal Superior do Trabalho julgou o Incidente de Recurso Repetitivo para admitir a mera declaração de pobreza para a concessão dos benefícios da justiça gratuita, desde que não haja prova em contrário (Tema nº 21). Da decisão, contudo, ainda é possível a interposição de Recurso.
Desde a entrada em vigor da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/17) discutiu-se muito acerca da nova redação dada ao artigo Art. 790, §§ 3º e 4º, da CLT, que assim dispõe:
Art. 790. Nas Varas do Trabalho, nos Juízos de Direito, nos Tribunais e no Tribunal Superior do Trabalho, a forma de pagamento das custas e emolumentos obedecerá às instruções que serão expedidas pelo Tribunal Superior do Trabalho.
(...)
§ 3o É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
§ 4o O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo.
Conforme a nova redação do dispositivo legal, portanto, passou a se adotar, ainda que de forma cautelosa, o entendimento de que a concessão do benefício da justiça gratuita seria deferida àqueles com salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do RGPS, o que corresponderia atualmente a R$ 3.114,40 (três mil cento e quatorze reais e quarenta centavos), com a necessidade da comprovação da insuficiência de recursos.
Ao longo destes quase sete anos da reforma trabalhista, no entanto, ainda não havia um entendimento pacificado acerca da necessidade ou não da comprovação da insuficiência de recursos, mas a maioria das decisões já caminhava no mesmo sentido adotado pelo Tribunal Superior do Trabalho no julgamento do Incidente de Recurso Repetitivo, muito em razão da Súmula 463, I, do TST, a qual estabelece que “para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado”, ainda que esta tenha sido publicada antes da Lei 13.467/17.
E se, por um lado, havia a visão de que a reforma trabalhista poderia trazer uma redução das ações trabalhistas ajuizadas, por outro lado, também é legítima a preocupação de que esta nova decisão pelo Tribunal Superior do Trabalho promova um aumento das demandas judiciais, por reduzir o receio do empregado em relação a uma possível improcedência e desnecessidade de se arcar com os custos (honorários e custas processuais) da perda do processo.
Veja que não se pretende discutir ou limitar o direito do hipossuficiente em ter acesso à justiça, o que lhe é constitucionalmente garantido e que deve sim ser protegido.
A reflexão que se traz é justamente em relação àqueles que abusam do direito invocado, que embarcam em verdadeiras “aventuras jurídicas” e que se valem da declaração de hipossuficiência para se eximirem das responsabilidades e ônus derivados de eventual insucesso da demanda.
Embora o entendimento atual seja de que é possível a produção de prova em contrário, a admissão de mera declaração de hipossuficiência gera precedente perigoso, principalmente pelo fato de que para a parte contrária (empregador) nem sempre é possível a produção da referida prova, seja por falta de informações e documentos probatórios ou até mesmo pela supressão das informações por parte do empregado.
Àqueles que diariamente militam na Justiça do Trabalho, não é incomum se deparar com reclamantes que auferiam salários voluptuosos, por longos períodos, e que ao ajuizarem a demanda requerem os benefícios da justiça gratuita, com a simples apresentação da declaração de hipossuficiência.
Como é possível, então, impugnar e provar a ausência de hipossuficiência do empregado? Como atuar dentro do processo a fim de demonstrar que aquela pessoa possui, de fato, condições de arcar com as custas do processo?
Em primeiro lugar, é necessário que a própria Justiça do Trabalho possibilite a produção desta prova. Como exposto anteriormente, muitas das vezes o empregador não possui a documentação consigo e nem mesmo as condições de reunir as informações para apresentar com sua defesa.
E se a Justiça do Trabalho irá admitir a mera declaração de hipossuficiência como prova da vulnerabilidade financeira, também deverá permitir que as empresas possam produzir as provas necessárias para contestar tal declaração quando, claro, houver dúvidas e indícios de que esta não corresponda à realidade.
Pela empresa, por outro lado, competirá buscar meios de comprovar a boa condição financeira do empregado, como por exemplo, a busca em redes sociais profissionais, como o Linkedin, as quais são usualmente atualizadas com as novas recolocações no mercado de trabalho.
As redes sociais “comuns”, públicas, também podem ser objeto de buscas, visando demonstrar algum tipo de ostentação, viagens, presenças em locais caros, entre outros.
Caso o empregado também seja um empreendedor ativo, essencial a juntada dos documentos comprobatórios desta condição (registro em Junta Comercial, quadro societário da pessoa jurídica), sendo mais um mecanismo para desconstituir a suposta hipossuficiência.
Já em juízo, não tendo o reclamante juntado sua Carteira de Trabalho atualizada, caberá o requerimento para que o autor apresente a documentação, forçando-o a comprovar a inexistência de ocupação profissional em vigor.
Neste mesmo sentido, havendo notícias de ocupação profissional informal (atuação como Pessoa Jurídica, trabalhos autônomos), poderá haver requerimento de expedição de ofícios para as tomadoras dos serviços, a fim de que respondam acerca do objeto da contratação, bem como dos valores envolvidos.
Tais requerimentos não visam a violação à intimidade do empregado, mas sim a garantia do direito de defesa do empregador, em virtude da presunção de veracidade da declaração de pobreza.
Diante disso, temos que esta nova decisão do Tribunal Superior do Trabalho poderá acarretar novos desafios aos empregadores, principalmente quando estiver perante uma situação de abuso de direito, razão pela qual a atuação estratégica, de acordo com cada caso, será primordial na defesa dos interesses da empresa.
A Equipe Trabalhista do Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados está preparada e à disposição em caso de dúvidas em relação ao tema.
Gustavo Akira Sato