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A Comercialização de Imóveis em Áreas Litorâneas

Foto do escritor: Eichenberg, Lobato, Abreu & Advogados AssociadosEichenberg, Lobato, Abreu & Advogados Associados

A aquisição e comercialização de imóveis localizados em áreas litorâneas do Brasil envolve uma análise cuidadosa das particularidades legais, especialmente em relação aos Terrenos de Marinha, que são imóveis situados nas faixas litorâneas próximas ao mar, também, de alguns rios e lagos, e seus respectivos regimes jurídicos.


Os terrenos de marinha são bens da União, classificados como patrimônio de domínio público. Para compreender os caminhos para o uso, aquisição e regularização dessas áreas, é importante conhecer sua origem.


A SPU e os terrenos da União


O instituto dos terrenos de marinha tem suas raízes na formação do território brasileiro no período colonial, com a divisão das terras a partir do Tratado de Tordesilhas (1494) entre Portugal e Espanha. A primeira legislação sobre o tema foi a Lei das Sesmarias de 1531, que estabelecia a distribuição das terras através das Capitanias Hereditárias, com o objetivo de fomentar a ocupação territorial. A Lei de Terras de 1850 consolidou um regime jurídico para as terras públicas do Império, reservando a ele a destinação de terras para colonização indígena, povoação e construção naval, incluindo entre estas as faixas litorâneas. Após a Proclamação da República e a transição para o regime federal, a União assumiu o domínio sobre essas áreas.


A gestão do patrimônio público nacional esteve historicamente vinculada à Secretaria do Patrimônio da União (SPU), uma das mais antigas repartições públicas do estado brasileiro, que nasceu na configuração da antiga Repartição Geral de Terras Públicas, com ênfase na administração fiscalista durante o Império e a República, até a promulgação da Constituição de 1988. A partir de então, a União passou a ser responsável pela administração dos terrenos de marinha, incluindo as faixas litorâneas das grandes capitais e outras regiões costeiras, cabendo à SPU a regulamentação e o controle de seu uso e alienação.


Regimes Jurídicos dos Imóveis Litorâneos: Ocupação e Aforamento


A aquisição de terrenos de marinha exige a compreensão dos regimes jurídicos que regem esses imóveis: a ocupação e o aforamento. A distinção entre esses regimes é essencial para entender as implicações legais e as possibilidades de aquisição.


Ocupação


No regime de ocupação, o uso do imóvel é uma mera tolerância da União, que mantém o domínio pleno sobre a propriedade, sem conferir titularidade ao ocupante. A ocupação, conforme o artigo 7º da Lei nº 9.636/98, caracteriza-se como um direito de natureza pessoal, e não real, podendo ser revogada pela União a qualquer momento. Embora muitos imóveis nas faixas litorâneas estejam sob esse regime, ele é marcado pela precariedade, uma vez que a União pode exigir a desocupação do imóvel no prazo de 30 dias, especialmente em situações de interesse público, como a implementação de sistemas viários, por exemplo, ou para a consecução de outros projetos de finalidade pública. Nesse contexto, cabe ao particular adotar medidas legais para evitar ou minimizar os impactos de tal exigência. Para a inscrição da ocupação, o terreno deve ser efetivamente utilizado, sendo que o ocupante deverá pagar uma taxa anual de ocupação de 2% sobre o valor de avaliação do imóvel feito pela SPU.


Aforamento


O regime de aforamento, por sua vez, confere um direito real sobre o imóvel, transferindo o domínio útil de 83% do terreno ao foreiro por meio da sua aquisição, que paga, ainda, uma renda anual (foro) de 0,6% do valor do imóvel. Derivado do instituto da enfiteuse, o aforamento permite ao titular do domínio útil usar e transferir o imóvel, desde que respeite as condições estipuladas pela União. Por ser um direito real, é oponível até mesmo à União, que concede o domínio útil por meio do contrato de aforamento. Esse regime oferece maior segurança jurídica ao particular, permitindo que o imóvel seja utilizado inclusive como garantia em operações, diferente da ocupação.


Em vários casos, é possível obter o aforamento gratuito do imóvel, por meio de uma análise minuciosa da documentação registral correspondente.


As principais diferenças entre os regimes são a precariedade e a natureza de direito pessoal da ocupação, que pode ser revogada pela União a qualquer tempo, e a estabilidade jurídica do aforamento, que confere um direito real e passível de registro. A ocupação envolve o pagamento de uma taxa anual de 2% sobre o valor do domínio pleno, enquanto o aforamento exige o pagamento, além da aquisição do domínio útil de 83% do imóvel (quando não se tratar de aforamento gratuito), do foro anual de 0,6%.


A Faixa Litorânea e os Desafios de Demarcação da LPM


Embora os terrenos de marinha estejam localizados em áreas litorâneas, a demarcação dessas terras representa um grande desafio jurídico e técnico. De acordo com o Decreto-Lei nº 9.760/46, a faixa litorânea é definida como a área situada até 33 metros da linha do preamar médio de 1831. Assim, há dois critérios para a definição da faixa: um temporal, relacionado à linha das marés cheias de 1831 (a LPM), e um geográfico, referente aos terrenos localizados até 33 metros dessa linha. A precisão na determinação dessa linha é complexa, pois exige cálculos técnicos baseados nas tabelas de marés, tornando a demarcação das faixas de domínio um processo moroso.


Outro desafio histórico está relacionado ao registro imobiliário desses imóveis. A União mantém um cadastro próprio, denominado Registro Imobiliário Patrimonial (RIP), que deveria ser averbado nas matrículas dos imóveis. No entanto, essa averbação nem sempre é realizada, o que resulta, com frequência, em um descompasso entre o registro imobiliário e o cadastro da União, dificultando a identificação e a regularização dos terrenos de marinha.


Em diversas localidades, como algumas relevantes regiões de Santa Catarina e outras capitais e áreas de destaque no Brasil, a maioria dos imóveis situados na faixa litorânea encontra-se sob o regime de ocupação ou sequer possui o Registro Imobiliário Patrimonial (RIP).


No entanto, como já mencionado, o regime de ocupação é precário, como preconiza a Súmula 496 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a qual estabelece que os registros de propriedade particular de imóveis localizados em terrenos de marinha são inoponíveis à União. Isso significa que, embora o imóvel esteja registrado em nome de um particular no Registro de Imóveis, ele permanece sob domínio público, e a União pode reivindicar o imóvel a qualquer momento, caso não esteja sob o regime de aforamento.


Cuidados na Aquisição de Imóveis em Áreas Litorâneas


A aquisição de imóveis em áreas litorâneas exige, assim, atenção especial, sendo crucial a verificação detalhada da situação jurídica desses bens, especialmente quando a compra se destina ao desenvolvimento de empreendimentos imobiliários, devido às particularidades que envolvem os processos de incorporação imobiliária no Registro de Imóveis e de fracionamento dessas áreas junto à SPU.


Entre os passos principais, destacam-se resumidamente os seguintes:


  1. Consulta ao RIP (Registro Imobiliário Patrimonial): O RIP é o cadastro da União e é fundamental para confirmar a regularidade do imóvel perante a administração pública. Caso o imóvel não possua o RIP, é necessário solicitá-lo junto à SPU.

  2. Obtenção da Ocupação e/ou Aforamento: Se o imóvel não se encontra sob um desses regimes, o adquirente deve buscar enquadrá-lo, de acordo com os objetivos para uso ou desenvolvimento da área. A escolha entre Ocupação e Aforamento deverá ser avaliada estrategicamente, conforme a finalidade planejada para o imóvel e as questões afetas à demarcação da LPM na região em que está localizado. A Ocupação permite o uso do imóvel de domínio da União de forma precária, enquanto o Aforamento concede o direito real sobre o domínio útil do imóvel.

  3. Laudêmio: Além do ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Imóveis), o adquirente de um imóvel de marinha deve pagar o laudêmio, que corresponde a 5% do valor do terreno, excluindo-se as benfeitorias. O pagamento do laudêmio é obrigatório para que a transferência seja aprovada pela União.

  4. Certidão de Autorização de Transferência (CAT): Para que a transferência de um imóvel de marinha seja válida, é necessário obter a CAT, emitida pela SPU. Esse documento autoriza a alienação do imóvel, mediante o pagamento do laudêmio.

  5. Averbação da Transferência: Após a lavratura da escritura pública, a transferência de titularidade deve ser levada não apenas ao Registro Imobiliário, mas também informada junto à SPU. A não comunicação pode resultar em multa ao adquirente por descumprimento da exigência legal.

  6. Fracionamento: Quando o objetivo é desenvolver um empreendimento imobiliário com a venda de unidades autônomas, é necessário realizar o processo de fracionamento do terreno de marinha junto à SPU, de modo que cada unidade privativa restará com RIP próprio e seu titular será o adquirente da respectiva unidade.


Análise Estratégica na Regularização de Imóveis Litorâneos


A comercialização de imóveis localizados em áreas litorâneas sob domínio da União exige uma análise rigorosa da legislação vigente, especialmente no que se refere aos regimes de ocupação e aforamento. A complexidade na demarcação da faixa litorânea, aliada à desarticulação entre os registros imobiliários e os cadastros da União, torna essencial a diligência jurídica para evitar contratempos futuros.


Além disso, é crucial manter-se atento às mudanças legislativas e às regulamentações específicas sobre os imóveis da União, que frequentemente sofrem propostas de alteração nas normas de regularização, impactando o cenário jurídico desses bens.


Portanto, é imprescindível a verificação e obtenção do RIP, a regularização da Ocupação e/ou Aforamento, e, no caso de transmissão, a obtenção da CAT, a comprovação do laudêmio e a regularidade da transação junto à SPU. No caso de incorporações imobiliárias, o fracionamento do imóvel deve ser realizado junto à SPU, assegurando o devido registro do RIP para cada unidade autônoma.


Dessa forma, uma análise detalhada e estratégica é indispensável, envolvendo os objetivos do negócio na aquisição e uma diligência cuidadosa, realizando uma fotografia precisa da situação atual do imóvel e traçando uma estratégia de regularização que esteja alinhada aos objetivos e prazos do adquirente e empreendedor.


Luciellen Santos Leitzke

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